quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

MANIFESTO

 comentário enviado à revista Visão, via email, 18.Jan.2011


Sobre o artigo “GERAÇÃO NEM-NEM”, Revista Visão, 13 de Janeiro 2011

Esta semana deparei-me com a vossa reportagem da designada Geração "Nem-Nem" ou "Geração Zero" que, a meu ver, tem imprecisões e falta de conhecimento que abrange muitas áreas, nomeadamente as artísticas, da qual faço parte. Sou arquitecta (estagiária, na recta final) e, se por um lado, tenho de concordar com diversos factos que são abordados ao longo da reportagem, tenho, por outro lado, que discordar com outros. Segue-se o exemplo de, quando uma Socióloga, de seu nome, Cláudia Ferreira, refere comentários do tipo "O meu menino é doutor, não vai ganhar 500 euros num call-center, é uma vergonha.". Vergonha é generalizarem-se ideias deste género. A verdade é que, quem me dera, que, como arquitecta, pudéssemos ganhar 500 euros, ou sequer haver oportunidades na minha classe para tal. Mais acrescento que, não entrando num tom pejorativo neste texto, todas as pessoas são necessárias à sociedade e cabe a cada uma delas fazer decisões relativamente à sua vida profissional.
Ora, se uns optam por iniciar a sua vida profissional findo o 9º ou o 12º ano (ou quando for), há outros que investem anos da sua vida (e não só) para se qualificarem superiormente para poderem garantir uma estabilidade futura. A verdade é que isto já não acontece, e foi nesta falácia que todo esse investimento foi feito e, em esperança, assumido. Estabilidade é conceito que já não existe no enquadramento social de hoje. E falo da realidade que me é mais próxima, que, tendo formação superior, investido quase dois anos da minha vida na Holanda e em Inglaterra (em formação e estágio), chegar a Portugal e aperceber-me de casos hilariantes que não dignificam nem a classe nem o valor de cada um é, no mínimo, desolador. Exemplo dessa realidade é existir uma maior remuneração para um emprego part-time (4 horas) num escritório, duma técnica sem formação superior, e, nesse mesmo escritório, um arquitecto nem o ordenado mínimo ganhar. Outro caso, ainda mais gritante, é o anúncio que um atelier publicou no site do IEFP em que pediam todas as qualificações e mais algumas a um arquitecto com, salvo erro, 3 anos de experiência e, adivinhem, a remuneração era um tesouro: 483 euros. Onde chegámos? Não me venham dizer que é uma vergonha NÃO serem aceites estas verdadeiras pérolas laborais! Citando um documento – finalmente! – escrito e divulgado – Declaração Maldita – redigido por um grupo de arquitectos, conscientes e revoltados com a actual realidade, “Por outro lado, o desemprego e o trabalho precário generalizaram-se, reflectindo uma realidade na qual uma parte muito significativa dos arquitectos vive, actualmente, de forma instável, com rendimentos inferiores e menos direitos sociais que um trabalhador manual não especializado.”. E chamo a atenção de todos os quantos tiverem a paciência e a sagacidade de ler este texto: aceitar este tipo de trabalho, com esta remuneração, é, em primeiríssima instância, um desrespeito para a classe. Porque se há um que aceita, existirão mais que aceitam de certeza. Enquanto não houver uma tomada, oficial, de posição face a esta degradação, não há, lamentavelmente, muito a fazer.

Situações como estas existem numa escala que não chega ao público, e este continua a pensar que "Ser Arquitecto" é sinónimo de se ser rico. Há um pedantismo – iminentemente social e intelectual - (presente também no núcleo restrito que é a "imagem de marca" da classe, sem marcar coisa alguma para os seus pares) que é assustador, tremendamente assustador e redutor.  Prestar serviços de arquitectura ainda está conotado com um elitismo ridículo e infundado. E, aliado a este facto, muitos outros consubstanciam a precariedade da profissão para a grande maioria. Sublinho, precariedade para a grande maioria. Citando novamente a Declaração Maldita – “realidade laboral em arquitectura define-se, de uma forma genérica, pela dificuldade no acesso à profissão, pela falta de autonomia criativa e disciplinar, pelo aumento do desemprego, pelos baixos salários, e pela precariedade e instabilidade permanentes no trabalho.”. Neste parágrafo é notória a condição de se ser arquitecto em Portugal. Comentários como “(…) o comodismo e o culto da lamentação existem nos recém-licenciados e são, na maioria, alimentados pelos pais.” Não deveriam, uma vez mais, ser generalizados porque, admito, que há muita gente que nasceu em berço de ouro e da vida não sabe absolutamente nada; no entanto há os outros que por saberem onde querem chegar esforçam-se, investem, sacrificam-se e, ao permanecerem neste país, quase tudo lhes é negado, profissionalmente falando. Citando uma vez mais a referida Declaração, “A evolução do mercado de arquitectura, nas últimas décadas, tem vindo a sedimentar-se em torno dos gabinetes de maior dimensão, que associam à ideia de grande empresa o conceito de arquitecto-estrela, cujo trabalho é publicitado nas publicações da especialidade e nos meios académicos. Esta imagem de arquitecto-estrela, que deriva quer do ideal romântico do artista-criador, quer da relação mestre-aprendiz típica das oficinas medievais, prática continuada até ao recente aumento exponencial do número de arquitectos em Portugal, consolidou-se numa ideologia que justifica a desregulação do trabalho na empresa de arquitectura contemporânea. Assim, atrás da ideia de colaboração entre arquitectos esconde-se a realidade actual da crescente proletarização do trabalho em arquitectura.”

Não sendo esta realidade a suficiente, para oficializarmos o processo de exercício da profissão em Território Nacional, precisamos (condição essencial) de estar registados na Ordem dos Arquitectos. Ora este processo, caros leitores, desde a fase inicial até ao final do processo de estágio, não custa menos de 300 euros, aos que lhe somam cerca de 200 euros anuais. Pergunto – pergunta inocente – como é que um arquitecto em início de carreira, com a inevitabilidade de estar numa situação laboral precária (vulgo recibos verdes) e, como esta, se agravou nas últimas decisões governamentais, poderá comportar estes valores e poder assegurar a sua independência? Muito mais havia para ser discutido, mas julgo ter ficado aqui expresso uma pequena parte do desconhecido universo que envolve uma das profissões, avaliadas pelos profissionais que credibilizam a reportagem como sendo uma das que não tem saídas profissionais.

Para terminar, não querendo alongar-me mais, apelava à leitura da referida Declaração, que pode ser acedida através do endereço http://malditaarquitectura.blogspot.com/ . Reflictam, e questionem se somos nós que somos os acomodados às lamentações, ou se são vontades alheias que não nos permitem estabelecer na profissão. Da designação da geração,  zero, não poderiam ter acertado melhor: é, pois, a quantia que nos sobra ao final dum mês, depois de IVA, Segurança Social, quotas da ordem, passes, alimentação, etc, etc, etc, tudo isto em condição precária de recibos verdes.

Resta-me deixar-vos os melhores cumprimentos, esperando que parte deste texto possa ser publicado na próxima edição,
Ana Pacheco

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

confrontação... partir, de novo.

não é meu o país que nega a oportunidade e a confiança. não é meu o país que se veste, pesadamente, dum negro invísivel. não é meu o país em que os rostos estão cravados de conformismo. não é meu, de todo, o país onde se nos negam os sonhos.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Beyond Words II

Londres,


7de Janeiro, 2011

Ao sétimo dia do ano – e rejeito qualquer sentido esotérico ou religioso associado - as memórias dum outro que mal terminou afluem a cada instante do que ainda mal começou. Os momentos ímpares num ano par. Outros e igualmente intensos momentos ímpares aguardam-se num ano ímpar.

Não são cunhadas de melancolia ou qualquer outro sentimento que se lhe assemelhe. Não. A verdade, e em igualdade a outro momento de partida da minha vida, também este é marcado por fragmentos de tempo, lugar e espaço que se elevaram por terem sido vividos de forma plena e partilhados com pessoas extraordinárias.

Não são de bajulação gratuita e insípida estas palavras. Antes de exaltação. Por tudo e pelo nada que permitiram as chegadas e os encontros. Nunca fugazes. Nunca efémeros. E que o tivessem sido numa dimensão temporal, nunca o foram em essência. Em partilhas e cumplicidades. E tudo o que isso compreende. E compreende tanto.

Também não são de despedida estas palavras. Porque não me será possível dizer um “adeus” às pessoas que marcaram estes meses. Antes será um até já indefinido, mas com a certeza do reencontro. Amanhã ou daqui a meses. Mas será. Dizia noutro dia que a intensidade de determinados momentos é intransponível para qualquer tipo de palavras. It’s beyond words. E as pessoas que entraram nesta realidade intensa e irrepetível dispensaram a conquista de algo. Apenas estiveram, permaneceram. Permanecem e estão. Permanecemos e estamos. E tudo o que isto envolve – em primeira instância, as pessoas – é absolutamente singular. Ímpar.

O nosso universo, em abstracto, é constituído de transformações, já afirmava Lavoisier. Em que nada perco, mas também nada ganho, Mas transformo-me e transformo toda e qualquer variável da minha vida nesta circunstância. No balanço final, contrariando, acredito que ganho sempre. Existem as transformações, em que somos confrontados com questões que ora nos causam muitas vezes o pânico silenciado ora nos invadem, interiormente, de forma a nos testarem em aproximações de instintos de sobrevivência. Violento. Dispenso as afirmações do contrário.

As pessoas. Sempre permanecem poucas que decidem a cada dia ficar, duma forma mais ou menos subliminar. Decidem, traz-me o conforto. Prefiro poucas. Poucas, será relativo. Julgo. Antes prefiro escrever, as que querem estar. E as que eu sinto que estão. Correspondência, portanto. E não estando todas na mesma dimensão, estão, independentemente das vicissitudes que possam, física e espacialmente, separar. Não interessa. Não me interessa isso. A sério. Incluíram-se algumas nestes tempos. Ausentaram-se outras. As que chegaram. Essas. As que permitiram que cada dia neste mar agressivo de gente fosse cunhado com o conforto e aconchego que sempre amparam as quedas subjacentes às grandes decisões. Dispenso as nomeações, porque não faz sentido fazê-lo. E também dispenso o lugar comum de “as pessoas sabem quem são”. Porque para além do saberem, de facto, faço questão que o saibam, duma maneira mais ou menos subliminar. Não há teoremas ou equações para isto. Não há. A verdade é que, uma vez mais, confirmou-se o que já anteriormente defendi: inexistência de proporcionalidade directa entre tempo e solidez de sentimentos. E nisto vai uma densidade extrema e incrível.

Gosto de todos e de cada um dos fragmentos de tempo partilhados com cada uma das pessoas que habitou estes meses. Gosto de cada coisa que me ensinaram. Gosto de cada silêncio que tivemos. Gosto de cada cumplicidade estabelecida. Gosto de cada piada que fizemos nossa. Gosto de cada regresso a casa. Gosto de cada música que conheci. Gosto do puntting que fizemos, quais colegiais. Gosto de cada textura de óleo em tela que vimos. Gosto de cada tom de vermelho em tijolos erguidos no auge e epicentro dessa revolução. Gosto de cada abraço sentido. Gosto de cada deambular nestas ruas. Gosto do chá tomado no Mr. Scruff. Gosto de cada jantar partilhado. Gosto do elitismo académico de Oxford. Gosto de cada gargalhada insana. Gosto de cada filme na atmosfera do coronet. Gosto de presença dos que estão distantes. Gosto do meu bairro. E da minha Hereford Road. Gosto de todas as vezes que fui e regressei a Cambridge. Gosto do regresso à infância no Hamleys. Gosto da elegância da Regent. Gosto dos lugares descobertos em acasos. Gosto da industrialidade de Manchester. Gosto da ruralidade das quintas. Gosto da Guinness que tomámos em Dublin. Gosto da despretensão trendy do East Side. Gosto de me perder no Borough Market. Gosto do excesso de Camden. Gosto de cada conversa que tive. Gosto de cada gesto improvável. Gosto, sem ensaios, das pessoas que permitiram este móbil interminável de recordações.

Gosto, presente. Porque sê-lo-ão sempre em presente. Em qualquer tempo. Aqui. Vocês!

Obrigada!

Até já.

A

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

beyond words

major decisions ahead.
major memories now.
major people ever.
major moments then.
major everlasting feelings.